sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Receita de Mulher


Os olhos sejam de preferência grandes
E de rotação pelo menos tão lenta quanto
A da terra. (Vinícius de Moraes)

O seu semblante, redondo
Sobrancelhas arqueadas
Negros e finos cabelos
Carnes de neve formadas. (Thomaz Antônio Gonzaga)

Simpáticas feições, cintura breve,
Graciosa postura, porte airoso,
Uma fita, uma flor entre os cabelos. (Gonçalves Dias)

Verde carne, tranças verdes. (Garcia Lorca)

Lábios rubros de encanto
Somente para o beijo. (Junqueira Freire)

A sua língua, pétala de chama. (Cândido Guerreiro)

Nos lobos das orelhas
Pingentes de prata. (Gonçalves Crespo)

Mão branca, mão macia, suave e cetinosa
Com unhas cor de aurora e luz do meio dia
Nas hastes cor-de-rosa. (Luiz Delfino)

Os braços frouxos, palpitante o seio. (Casimiro de Abreu)

O dorso aveludado, elétrico, felino
Porejando um vapor aromático e fino. (Castro Alves)

Seu corpo tenha a embriagues dos vícios. (Cruz e Souza)


Com mil fragrâncias sutis
Fervendo em suas veias
Derramando no ar uma preguiça morna. (Teófilo Dias)

Nádegas é importantíssimo
Gravíssimo porém é o problema das saboneteiras
Uma mulher sem saboneteiras
É como um rio sem pontes. (Vinícius de Moraes)

As curvas juvenis
Frescas de ondulações de forma florescente
Imprimindo nas roupas um contorno eloquente. (Álvares de Azevedo)

Qualquer coisa que venha de ânsias ainda incertas
Como uma ave que acorda e, inda mal acordada,
Move, numa tonteira, as asas entreabertas. (Amadeu Amaral)


De longe, como Mondrians
Em reproduções de revistas
Ela só mostre a indiferente
Perfeição da geometria. (João Cabral de M. Neto)

Que no verão seja assaltada por uma
Remota vontade de miar. (Rubem Braga)

A graça da raça espanhola
A chispa do Touro Miura
Tudo que um homem namora
Tudo que um homem procura. (Paulo Gomide)


E todo o conjunto deve exprimir a inquietação e espera. Espera, eu disse? Então vou indo, que senão, me atraso!
*Vinícius que me perdoe plagiá-lo. Mas beleza é fundamental.

Millôr Fernandes

Com licença poética





Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.

Adélia Prado

terça-feira, 27 de agosto de 2013

Quando eu te encontrei!!!




Acredito que tudo começou com troca de olhares e depois palavras...
verdadeiramente no inicio não acreditava tanto... 
mas as palavras foram como semente que vão ao vento e encontram um lugar, 
um solo e la caem... e lá ficam até crescer.
suas palavras encontraram lugar no meu coração... 
palavras puras e sinceras cheias de sentimentos...
e foram regadas... e cada dia cresce mais..
Acreditava que seria um paixão rápida e depois seria somente culpar
a distância e os problemas,
então como não era apenas uma paixãozinha,
 descobrir que era amor quando na hora de dizer boa noite dava vontade de dizer te amo.
Percebi que um grande amor cresceu quando não dava mais pra ficar longe ( esse amor dura a vida inteira, muda a vida definitivamente), 
quando você me inspira os melhores sentimentos e a magia de escrever...
Existe mais poesia no olhar de quem ama do que em mil poemas que se escrevam… Mas, nem por isso devemos deixar de escrever mil poemas para mostrar ao mundo o que esse olhar procura dizer…
O que escrevo não é exatamente uma poesia... mas acredito na magia das palavras nos sentimentos que ela podem transmitir...


Queila Tavares

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Sombras - (De los ojos de un Almendro)



Con sombras claras y figuras
uniformes el río trasporta
las almas solas, las almas
moribundas.

Inertes y veloces son los
pensamientos enamorados,
razón tiene la erosión para
colapsar la roca, como colapsa
mi espíritu aventurero.

El viento pregona mi muerte,
mientras el equinoccio de
invierno enfría tus besos.
Tristeza y alegría, la primera
por tu partida, la otra por llevarte
en mi corazón mientras
trascurre la vejez de mi cuerpo.

Una sombra gris posa sobre las
nubes altas, la brisa anuncia
una llovizna y mis párpados
se cierran en el sueño de tu compañía.

Autor Desconhecido

domingo, 25 de agosto de 2013

Máscaras





Cada vez que ponho uma máscara para esconder minha realidade,
 fingindo ser o que não sou, fingindo não ser o que sou,
 faço-o para atrair o outro e logo descubro que só atraio a outros mascarados
distanciando-se dos outros devido a um estorvo: a máscara. 
Faço-o para evitar que os outros vejam minhas debilidades
e logo descubro que, ao não verem minha humanidade,
os outros não podem me querer pelo que sou, senão pela máscara.
Faço-o para preservar minhas amizades e logo descubro que, quando perco um amigo, por ter sido autêntico, realmente não era meu amigo, e, sim, da máscara.
Faço-o para evitar ofender alguém e ser diplomático e logo descubro que aquilo que mais ofende às pessoas, das quais quero ser mais íntimo, é a máscara.
Faço-o convencido de que é o melhor que posso fazer para ser amado e logo descubro o triste paradoxo: o que mais desejo obter com minhas máscaras é, precisamente, o que não consigo com elas.


Gilbert Brenson Lazan

Ode ao gato





Os animais foram imperfeitos, 
Os animais foram imperfeitos, 
compridos de rabo, tristes de cabeça. 
Pouco a pouco se foram compondo, 
fazendo-se paisagem, 
adquirindo pintas, graça, vôo. 
O gato, 
só o gato 
apareceu completo 
e orgulhoso: 
nasceu completamente terminado, 
anda sozinho e sabe o que quer.

O homem quer ser peixe e pássaro 
a serpente quisera ter asas, 
o cachorro é um leão desorientado, 
o engenheiro quer ser poeta, 
a mosca estuda para andorinha, 
o poeta trata de imitar a mosca, 
mas o gato 
quer ser só gato 
e todo gato é gato 
do bigode ao rabo, 
do pressentimento à ratazana 
viva, 
da noite até os seus olhos de ouro. 
Não há unidade como ele, 
não tem a lua nem a flor 
tal contextura: 
é uma coisa só 
como o sol ou o topázio, 
e a elástica linha em seu contorno 
firme e sutil é como 
a linha da proa de uma nave. 
Os seus olhos amarelos 
deixaram uma só ranhura 
para jogara as moedas da noite 
Oh pequeno imperador sem orbe, 
conquistador sem pátria 
mínimo tigre de salão, nupcial 
sultão do céu 
das telhas eróticas, 
o vento do amor 
na intempérie 
reclamas 
quando passas 
e pousas 
quatro pés delicados 
no solo, 
cheirando, 
desconfiando 
de todo o terrestre, 
porque tudo 
é imundo 
para o imaculado pé do gato. 
Oh fera independente 
da casa, arrogante 
vestígio da noite, 
preguiçoso, ginástico 
e alheio, 
profundíssimo gato, 
polícia secreta 
dos quartos, 
insígnia 
de um 
desaparecido veludo, 
certamente não há 
enigma 
na tua maneira, 
talvez não sejas mistério, 
todo o mundo sabe de ti e 
pertence 
ao habitante menos misterioso, 
talvez todos acreditem, 
todos se acreditem donos, 
proprietários, tios 
de gatos, companheiros, 
colegas, 
discípulos ou amigos 
do seu gato. 
Eu não. 
Eu não subscrevo. 
Eu não conheço o gato. 
Tudo sei, a vida e seu arquipélago, 
o mar e a cidade incalculável, 
a botânica, 
o gineceu com os seus extravios, 
o pôr e o menos da matemática,

os funis vulcânicos do mundo, 
a casaca irreal do crocodilo, 
a bondade ignorada do bombeiro, 
o atavismo azul do sacerdote, 
mas não posso decifrar um gato. 
Minha razão resvalou na sua indiferença, 
os seus olhos tem números de ouro.

Pablo Neruda